quarta-feira, 3 de novembro de 2010

Entrevista com Henrique Júnior, Embaixador do Fedora no RJ

Ontem foi o lançamento do Fedora 14 e o embaixador do Fedora no Rio de Janeiro, Henrique Júnior, mais conhecido como LonelySpooky, nos respondeu algumas perguntas via email que provavelmente irão ajudar a esclarecer muitas dúvidas dos usuários em relação ao Fedora.






  1. As novas funcionalidades do Fedora 14 quando foram anunciadas deixaram a comunidade bem animada. Após algum tempo acabaram saíndo o Gnome 3 e o Upstart. Algumas pessoas nas redes sociais acusaram os desenvolvedores do Fedora de "pegarem mais leve" na versão 14 para trabalhar num provável lançamento do RHEL. O quanto disso é verdade e o quanto é mentira?
      Não faz muito sentido dizer que os desenvolvedores deixaram o Fedora de lado para se dedicar ao RHEL porque, embora muita gente não repare, o Red Hat é feito a partir do Fedora (e não o Fedora a partir do Red Hat), por isso é muito mais lucrativo investir num bom Fedora pois é ele que vai mostrar as tecnologias viáveis de inclusão no RHEL. Não existe, portanto, essa competição.
      Todo usuário percebe que, quando seu linux é iniciado, uma cascata de processos são disparados e fazem o sistema se comportar como deve. O systemd é uma maneira mais moderna de gerenciar todos esses (e outros) processos e a vantagem (entre várias) é influenciar drasticamente o tempo de inicialização e a inteligencia de gerenciamento.
      O problema é que, para desfrutar todas as vantagens do systemd, os serviços do sistema precisam ser preparados antes e muitos daemons vitais - como o CUPS - ainda não estavam prontos para lidar com a nova forma de inicialização. Testes, na época, fizeram parecer que o systemd, por estar muito imaturo ainda, não mostrara um grande ganho durante o boot.
      Outro problema grave foi que o chkconfig/system-config-services não havia sido convertido para lidar com o estilo do systemd. Isso, aliado à falta de boa documentação acabou provocando o adiamento.
      A feature já está pronta para o Fedora 15, diga-se de passagem.


  2. A política de lançamento do Fedora diz claramente que a distro não pode ser lançada enquanto ainda houver um dos chamados "Blocker Bug". No entanto, foi aberto esse mês um bug do Pino, considerado Blocker Bug, que não foi corrigido. Por que a data de lançamento do Fedora 14 foi confirmada mesmo assim? Qual foi a solução encontrada para resolver o problema?
      O problema do Pino foi bem interessante porque, na verdade, o culpado foi o Twitter, que migrou o padrão de autenticação para Oauth, lembram-se? Isso quebrou diversas aplicações pelo mundo, não apenas o Pino.
      Havia três abordagens possíveis aqui: reescrever o software para corrigir o bug; fornecer o Gwibber no lugar ou emitir uma “nota de versão” explicando porque o Fedora 14 viria sem um Twitt Client.
      Reescrever o software seria inviável porque o Fedora 14 já tinha passado da fase “Beta” e o Gwibber é grande demais para poder ser adicionado ao Live CD. A melhor opção foi avisar nas notas de versão que o Fedora 14 vem sem nenhum Twitt Client, mas que o Gwibber está disponível para instalação via YUM.


  3. O Fedora, por questões de filosofia, não trás nos repositórios partes consideradas importantes por muitos usuários, como os drivers proprietários Nvidia, o ffmpeg e os chamados Codecs Proprietários. Você acha que isso atrapalha a adoção do Fedora por parte dos usuários? Por que?
      A filosofia é uma parte, mas não é a causa para o Fedora não trazer codecs e drivers proprietários. Nos EUA, a legislação que tange a reprodução de formatos proprietários é bastante rigorosa. O Projeto Fedora não pode distribuir codecs porque a permissão de “distribuição” exige pagamento de royalties; entretanto, cada usuário tem permissão de instalar os codecs, desde que seja para uso pessoal. Por isso o Fedora não traz codecs, mas você, como usuário, pode instalá-los mesmo assim. A questão dos drivers (tomando o NVIDIA como exemplo) é que, sendo de código fechado, a NVIDIA não mostra o que os drivers “têm dentro” e por isso o Fedora ficaria preso, impossibilitado de corrigir bugs ou de garantir que nenhuma informação sensível está sendo repassada. Imagine o vídeo da distribuição inteira quebrando e o Fedora tendo que aguardar semanas ou meses por um bugfix da NVIDIA? Isso é chato para os usuários, mas desde que exista o RPMFusion e sempre seja possível instalar mesmo as coisas que o Fedora não traz por default, os danos não são muito grandes.


  4. Ainda em relação ao driver proprietário da Nvidia, o Kernel padrão do Fedora não permite a instalação do módulo da placa, precisando que o usuário instale o repositório RPMFusion para instalar o driver via pacote RPM. Isso não seria um pouco de má vontade da equipe de desenvolvimento do Fedora?
      É uma boa pergunta, mas a decisão de ativar o modo “GPL only” partiu dos desenvolvedores do Kernel (fora do Fedora) [1], que decidiram impor barreiras mais altas para o tipo de módulos que o Kernel pode trazer. Como os empacotadores do Fedora tentam sempre ser fieis aos desenvolvedores originais, naturalmente o Kernel Fedora vem com as restrições impostas por Torvalds & CIA.


  5. Uma das partes mais críticadas pelos usuários que testam o Fedora pela primeira vez é o visual. Muitas vezes o time de design é acusado de ser pouco participativo e pouco criativo. Para o Fedora 14, percebeu-se o trabalho do time de design na criação dos papéis de parede animados, a melhoria dos ícones e a adição da engine Equinox aos repositórios. Seria uma tentativa do Fedora de mostrar que de fato tem um time de design ativo e funcional?
      O time de design, na minha modesta opinião, sempre foi bastante ativo, mas muito burocrático, não rendendo o que deveria. Acredito que o Fedora 13 e o Fedora 12 foram grandes lições porque os problemas enfrentados pela equipe de design foram muitos e era, de faro, necessária uma reorganização de todo o processo. Com o Fedora 14 podemos ver o resultado de uma equipe mais madura e que entendeu que menos burocracia pode render resultados muito bons.


  6. O Fedora 13 Goddard foi aclamado por praticamente todos que o testaram como o melhor lançamento do Fedora em muitos anos. Qual o tamanho da responsabilidade da equipe ao lançar uma nova versão depois de uma tão bem sucedida? O que está sendo feito para manter a distro em um nível tão alto na versão 14?
      Converso sempre com alguns amigos sobre as diferenças entre uma release e outra e quase todos concordamos que, com o tempo e cada vez mais, as releases serão estáveis e funcionais porque o próprio linux alcançou esse estágio. Já passamos daquela fase onde cada release era uma revolução quando comparada à anterior porque coesão e maturidade são dois pontos importantes para que o Fedora (e o linux em geral) seja fácil de usar. Não quero dizer que não haverá inovações, porque, pode apostar, haverá muitas, mas tão bem acabadas que não causam susto.
      Acredito, enfim, que o Fedora 14 será melhor que o Fedora 13, assim como o 15 será melhor que o 14 porque esse é o curso natural das coisas: mais confortável, mais fácil de usar, mais bonito e sem fazer com que os usuários deixem de se sentir em casa.


  7. O Fedora não é considerado uma distro ideal para os iniciantes. Como o Projeto Fedora e os desenvolvedores tem trabalhado para afastar essa fama da distro?
      Muita gente não gosta de dizer e muita gente não gosta de ouvir, mas o Fedora não foca nos usuários iniciantes e provavelmente não focará. A distro é usada para desenvolvimento e serve de base para o Red Hat Enterprise Linux. Isso não significa que seja difícil de usar; bem pelo contrário, o Fedora é simples e direto, mas busca um sistema melhor em vez de “mimar” os usuários. Acho que a melhor forma de descrever o Fedora é dizendo que ele é o melhor equilíbrio entre facilidade e habilidade: não precisa ser geek para usá-lo, mas se for, não vai se sentir desmotivado.


  8. O Ubuntu é declarado pela maioria como a melhor distro para iniciantes. Existe algum desejo do Fedora de "roubar" esse título? Qual o foco principal da distro, em termos de usuários?
      Fedora e Ubuntu estão focados em caminhos muito diferentes e comprometidos com coisas diferentes. Do meu ponto de vista, o Ubuntu está mais interessado em fazer uma compilação de softwares para agradar aos usuários enquanto o Fedora desenvolve soluções para o sistema operacional, mas sem aquela visão de “produto”. De fato, durante o desenvolvimento do Fedora é muito raro alguém aparecer dizendo “o Ubuntu fez assim, vamos fazer parecido!”, porque as pessoas que fazem o Fedora estão mais interessadas no Fedora.


  9. Quais são os sites (ou o site) que você indica como boa (s) fonte de informação para um usuário que deseja adotar o Fedora?
      Bons sites em português são poucos, o que é uma pena, mas estas são as principais fontes:
      Website da comunidade brasileira (Oficial e com fórum): http://projetofedora.org/
      Fórum não oficial, mas tradicional: http://fedora.org.br/
      Wiki não oficial (mas com bom conteúdo e aberta a todos): http://fedora.wiki.br
      Lista de discussão em português (oficial): https://admin.fedoraproject.org/mailman/listinfo/br-users
      Website oficial (inglês): http://fedoraproject.org


  10. Como um usuário pode colaborar com o Projeto Fedora? Quais são as áreas e onde pode ser buscada mais informação?
      Basicamente qualquer pessoa que queira participar pode (e deve) participar. O Projeto Fedora precisa de embaixadores, que dão palestras, distribuem mídias, participam de listas de discussão e fóruns e “disseminam a palavra” de modo geral, também precisamos de pessoas com criatividade e que saibam desenhar para o grupo de design, desenvolvedores, webmasters, empacotadores, tradutores... não há restrições: se você quer fazer algo pelo projeto, com certeza há um espaço para você e a comunidade é muito acolhedora. Os detalhes e os passos para se juntar ao Projeto Fedora estão aqui: https://fedoraproject.org/wiki/Join/pt-br



[1] - http://www.linuxtoday.com/developer/2006121402026NWKNDV






Fedora e Ubuntu estão focados em caminhos muito diferentes e comprometidos com coisas diferentes. Do meu ponto de vista, o Ubuntu está mais interessado em fazer uma compilação de softwares para agradar aos usuários enquanto o Fedora desenvolve soluções para o sistema operacional, mas sem aquela visão de “produto”. De fato, durante o desenvolvimento do Fedora é muito raro alguém aparecer dizendo “o Ubuntu fez assim, vamos fazer parecido!”, porque as pessoas que fazem o Fedora estão mais interessadas no Fedora.



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